E sobre mim?

Minha foto
Alguém que tenta traduzir sentimentos através de palavras escritas, mesmo que algumas vezes essas palavras não sejam de minha autoria. Traduzir o que se sente é magnífico, e representar sentimentos através de palavras é dotá-los de significado para nós que sentimos e para outros que nos espiam. Este é o intuito deste blog, significar os sentimentos. Caros leitores sintam-se a vontade neste espaço para ler os sentimentos da autora e se quiserem “postem” comentários, eles serão bem vindos...

quinta-feira, 26 de maio de 2011


Construção

Amou  daquela  vez  como  se  fosse  a  última
Beijou  sua  mulher  como  se  fosse  a  última
E  cada  filho  seu  como  se  fosse  o  único
E  atravessou  a  rua  com  seu  passo  tímido
Subiu  a  construção  como  se  fosse  máquina
Ergueu  no  patamar  quatro  paredes  sólidas
Tijolo  com  tijolo  num  desenho  mágico
Seus  olhos  embotados  de  cimento  e  lágrima
Sentou  pra  descansar  como  se  fosse  sábado
Comeu  feijão  com  arroz  como  se  fosse  um  príncipe
Bebeu e  soluçou  como  se  fosse  um  náufrago
Dançou  e  gargalhou  como  se  ouvisse  música
E  tropeçou  no  céu  como  se  fosse  um  bêbado
E  flutuou  no  ar  como  se  fosse  um  pássaro
E  se  acabou  no  chão  feito  um  pacote  flácido
Agonizou  no  meio  do  passeio  público
Morreu  na  contramão  atrapalhando  o  tráfego

Amou  daquela  vez  como  se  fosse  o  último
Beijou  sua  mulher  como  se  fosse  a  única
E  cada  filho  seu  como  se  fosse  o  pródigo
E  atravessou  a  rua  com  seu  passo  bêbado
Subiu a  construção  como  se  fosse  sólido
Ergueu  no  patamar  quatro  paredes  mágicas
Tijolo  com  tijolo  num  desenho  lógico
Seus  olhos  embotados  de  cimento  e  tráfego
Sentou  pra  descansar  como  se fosse um príncipe
Comeu  feijão  com  arroz  como  se  fosse  o  máximo
Bebeu  e  soluçou  como  se  fosse  máquina
Dançou  e  gargalhou  como  se  fosse  o  próximo
E  tropeçou  no  céu  como  se  ouvisse  música
E  flutuou  no  ar  como  se  fosse  sábado
E  se  acabou  no  chão  feito  um  pacote  tímido
Agonizou  no  meio  do  passeio  náufrago
Morreu  na  contramão  atrapalhando  o  público
Amou  daquela  vez  como  se  fosse  máquina
Beijou  sua  mulher  como  se  fosse  lógico
Ergueu  no  patamar  quatro  paredes  flácidas
Sentou  pra  descansar  como  se  fosse  um  pássaro
E  flutuou no  ar  como  se  fosse  um  príncipe
E  se  acabou  no  chão  feito  um  pacote  bêbado
Morreu  na  contra- mão  atrapalhando  o  sábado

Por  esse  pão  pra  comer,  por  esse  chão  prá  dormir
A  certidão  pra  nascer  e  a  concessão  pra  sorrir
Por  me  deixar respirar,  por  me  deixar  existir,

Deus  lhe  pague

Pela  cachaça  de  graça  que  a gente tem  que  engolir
Pela  fumaça  e  a  desgraça, que  a  gente  tem  que  tossir
Pelos  andaimes  pingentes  que  a  gente  tem  que  cair,

Deus  lhe  pague

Pela  mulher  carpideira  pra  nos  louvar  e  cuspir
E  pelas  moscas  bicheiras  a  nos  beijar  e  cobrir
E  pela  paz  derradeira  que  enfim  vai  nos  redimir,

Deus lhe pague

                                                          Chico  Buarque

Um comentário: